Homenagem a Vivaldo da Costa Lima (Antropologia e Alimentação)

Vivaldo da Costa Lima, com o lançamento póstumo, pela Editora Corrupio, dos livros “A Anatomia do Acarajé e outros escritos” e “Olga Francisca Régis- Olga do Alaqueto – A comida de santo numa casa de queto na Bahia”, reitera, o que tentou disseminar nos seus últimos tempos, que a comida é boa para pensar (Lévi-Strauss), mas também para ensinar. No primeiro livro, uma coletânea de artigos, em sua maioria fruto de conferências e palestras em diferentes locais e décadas, daí a reiteração em alguns textos. Sem seguir a primorosa sequência da organização do livro, inicialmente com os artigos “Para uma Antropologia da Alimentação” e “Alimentação e Trópico”, Vivaldo aborda, do ponto de vista teórico e metodológico, a importância da alimentação para a Antropologia. Eclético, sem aderir aos modismos, tinha nos clássicos – de Douglas a Hertz – um porto seguro para as sua viagens, o que o possibilitou ver na comida a tradição, a estabilidade das práticas e representações, assim como os intercâmbios, as mudanças, o conflito, a questão do poder. E, em 1987, no Congresso Brasileiro de Tropicologia, em Recife, elaborou um conjunto de proposições metodológicas, definidoras do vasto campo dos estudos sobre alimentação no Brasil. Mais de 20 anos se passaram, muito foi realizado na última década, mas muito do preconizado, sobretudo na Bahia, permanece virgem. Abordando outro aspecto, passeia com os estudos da alimentação no Brasil: Manuel Querino, o abridor dos caminhos, o fundador; Gilberto Freyre, com seu clássico Açúcar (não Casa Grande & Senzala ); Câmara Cascudo, com sua monumental enciclopédia – História da Alimentação no Brasil – e também com sua Antologia; Jorge Amado, um dos responsáveis pela disseminação dos nossos quitutes pelo mundo afora, assim como pelo atual status da cozinha típica baiana. E, por fim, em um conjunto de artigos, aborda a comida baiana, com ênfase na cozinha de azeite. Demonstra que ela já estava aqui, através de Vilhena, nos finais do século XVIII, e que, progressivamente se incorporou, de forma ascensional, à vida dos baianos. Comida dos deuses que aqui chegaram, mas também dos homens, inicialmente de negros e pobres, e hoje comida de celebração de todos, inclusive das elites,  e conclui com seus saborosos e densos artigos sobre a Etnocenologia e Anatomia do Acarajé. Já no outro livro, sobre a cozinha do Ilê Maraiolaji, e sua comadre Olga do Alaqueto, é fruto de primoroso trabalho de campo. Através de sucessivas entrevistas com a veneranda ialorixá, são apresentadas as comidas de vinte orixás, de Exu a Obá. Com uma esclarecedora introdução, acrescida de uma aula sobre a cozinha sacrificial, passamos ao que os deuses comem, na linguagem pessoal da sempre admirada Olga do Alaqueto. As comidas são acompanhadas, em separado, pelas eruditas e esclarecedoras notas de Vivaldo da Costa Lima. No seu estilo inconfundível, Vivaldo da Costa Lima nos traz dois livros irreparáveis, que já nascem clássicos, indispensáveis para os estudiosos e interessados em alimentação.

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