EM NOSSA PELE I

Minha “sobrinha” que vi nascer, minha vizinha, hoje já uma mocinha, estudante de segundo grau de um colégio de classe média, mestiça, como eu, estava indignada porque ouviu um pai de uma aluna dizer que um dos livros indicados para a leitura ele não iria comprar. O livro era “Na Minha Pele” (Rio  de Janeiro: Objetiva, 2017 – 7ª reimpressão ), cujo autor era Lázaro Ramos. “Era porque ele era negro”, disse-me a jovem, cujo nome não cito, pois poderá sofrer perseguições no colégio.
     Evidentemente era um típico caso de racismo, onde não se admite um negro  na universidade e agora ainda tinham a ousadia de escrever livros. Eu já tinha comprado o livro, mas devido a meus compromissos acadêmicos e administrativos ainda não o tinha lido.
      Anos atrás no Teatro Vila Velha, Márcio Meireles, diretor do teatro e do Bando de Teatro Olodum, dissera-me que havia um ator no Bando que era excepcional e cedo iria estourar nacionalmente. Seu nome era Lázaro. Acertou em cheio. Nunca o vi atuando no teatro. Fascinou-me no cinema e depois na televisão. Um dia, em entrevista em jornal, falou sobre meu livro sobre Mário Gusmão. Já “estrela”, eu estava em um bar na Barra e ele passeava com minha aluna querida do Bando e assim fomos apresentados. Íamos até tomar uma cerveja, mas ele foi cercado por uma multidão e não nos conhecemos. Ele prosseguiu crescendo e cada vez com maior sucesso. Mas, eu não sabia o que ele pensava, inclusive vi uma ou duas entrevistas do seu programa de televisão, achando ele inteligente e gentil com seus convidados. Fui ler o livro, sempre temeroso em me frustrar, pensando ser mais uma narrativa autobiográfica, do vitimizado que venceu. Fiquei impressionado com o seu alto nível cultural, o que determina o prisma analítico com que fala da sua vida. Ele não brinca com a sua condição de negro numa sociedade racista, daí se autoquestionar e problematizar todo tempo a sua condição. Isso não significa que concordamos em tudo.
  O negro pobre não pensa no racismo e sim na sua sobrevivência, além de viver em bairros repletos de negros. Já o negro ascendente ou se “esconde” fingindo não existir o problema ou se inebria com o dinheiro se achando aceito sem problemas – incluindo a família - no mundo dos brancos. Espero que todos, negros e brancos, inclusive o “cidadão” semialfabetizado que o recusou, venham a lê-lo para entender assuntos que jamais questionou.. Daí, por sua grandiosidade,  resolvi fazer um modelo – a ser melhorado por professores que lidam com adolescentes – de como o seu livro pode ser usado didaticamente, em especial nas escolas dos abastados.. Existe um erro em toda essa estória, o livro de Lázaro não devia ser usado apenas em uma escola de classe média, devia estar em todas as escolas do Brasil.  Ah, leiam o livro, pois assim entenderão mais o modelo que lhes apresentarei brevemente. Vá em frente Lázaro e nos ensine cada vez mais sobre o mundo artístico e sobre a sociedade brasileira. E, por favor, não mude, pois como diz nosso Buda, “pobre de quem acredita na glória e no dinheiro para ser feliz”. Mas, não deixe de enriquecer (rs,rs), afinal, o capitalismo é cruel, sobretudo com os negros.  Mário Gusmão deve estar muito feliz com a trajetória que seu “sobrinho” vem construindo. 

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